domingo, 11 de julho de 2010

"Não subestimem as redes sociais"




Charlene Li, fundadora do Altimeter Group

Muitas companhias já estão usando as mídias sociais para se relacionar com os consumidores. Mas nem todas da forma correta. Mais um motivo para ouvir o que Charlene Li, uma das maiores especialistas nesta perigosa relação com a internet, tem a dizer

Por Bruno Galo

Em 2009, ela foi apontada pela revista norte-americana Fast Company como uma das mulheres mais influentes na área de tecnologia. É coautora do livro Groundswell: Fenômenos sociais nos negócios, um manual repleto de dicas, exemplos e estatísticas para o bom uso das mídias sociais nos negócios. Ela, que é fundadora do Altimeter Group, especializada em estratégias online, vem ao Brasil falar para mais de 500 executivos em seminário da HSM no final de março. Em entrevista exclusiva à DINHEIRO, Charlene explica por que os empresários não devem subestimar as redes sociais.

DINHEIRO – O que a sra. quer dizer com a expressão “groundswell” (ground-swell, em inglês, quer dizer algo como “forte e profunda ondulação no oceano” ou “repentina acumulação de forças”)?

CHARLENE Li – O groundswell é um movimento espontâneo de pessoas que conseguem o que precisam umas das outras graças às novas tecnologias, como as redes sociais, em vez de irem atrás de empresas, instituições ou governos. Quando nos juntamos online, uma grande força, que é muito difícil de ser parada, se forma. Não víamos isso no passado.


DINHEIRO – Mas por que as empresas devem prestar atenção ao "groundswell"?

CHARLENE – Não se trata apenas da multidão envolvida, mas da possibilidade realmente assustadora de que algum concorrente entenda este fenômeno primeiro e se aproveite dele de uma forma melhor e mais rápida. Mas esta não é a única ameaça. Outra tendência é de que pessoas conectadas e trabalhando de forma colaborativa já podem hoje concorrer com as empresas. E haverá cada vez mais produtos criados dessa maneira que competem com os produzidos pelas grandes empresas. Tudo isso pode ser uma ameaça ou uma oportunidade para as corporações. E para isso ser uma oportunidade é preciso compreendê-la.


DINHEIRO – Qual a importância das redes sociais para os negócios?

CHARLENE – Essencial. E há muitas maneiras de usá-las a favor dos negócios, como divulgação e para estreitar relacionamentos. O que está acontecendo afeta, sobretudo, a maneira como as pessoas conversam umas com as outras. Elas compartilham suas opiniões sobre produtos e marcas. Mesmo os funcionários podem estar falando de suas empresas. Há muitas formas diferentes de redes sociais. Mas seja você uma pequena empresa, seja uma grande companhia, precisa aprender a lidar com as mídias sociais.


DINHEIRO – O que vem primeiro: as pessoas ou a tecnologia?

CHARLENE – As pessoas, sem dúvida. A tecnologia só tem sentido se ela servir para que nos conectemos. Seja lá o que você ou sua empresa queiram, a tecnologia pode ajudar a conseguir. No livro, proponho um método de quatro etapas para desenvolver estratégias online, que chamamos de Post (acrônimo em inglês de pessoas, objetivos, estratégia e tecnologia). Primeiro, descubra como as pessoas com as quais quer se comunicar usam a tecnologia. Depois, estabeleça os objetivos, como impulsionar o marketing online. A terceira etapa é identificar de que maneira você quer mudar as relações com os clientes. Quer que eles estejam mais comprometidos com a empresa ou prefere que difundam mensagens entre seus conhecidos? Responder a essa pergunta ajuda a planejar a estratégia e medir seus avanços. Por último, vem a tecnologia. Por exemplo: a equipe de marketing da P&G criou uma comunidade no site beinggirl.com, depois de avaliar que meninas entre 12 e 15 anos visitam redes sociais. Assim, conseguiu atingir um público difícil de ser envolvido pelas campanhas tradicionais.



“A internet vai se tornar mais móvel. Quase tudo o que você precisa fazer conseguirá pelo celular ”


DINHEIRO – Toda empresa precisa ter um blog ou uma conta no Twitter?

CHARLENE – Absolutamente não. Muitas companhias não necessitam ter um blog ou estar em uma rede social. O segredo está em identificar a ferramenta correta, o que vai depender do público com quem você quer falar e do claro entendimento dos objetivos dessa relação. Mas todas as empresas precisam, ao menos, estar atentas ao que as pessoas estão fazendo e dizendo em seus blogs ou perfis do Twitter. Mudar o seu posicionamento e a sua relação pode ser algo muito difícil. Por isso, comece com um plano modesto, mas com potencial de crescimento.


DINHEIRO – Qual o canal mais eficiente para se desenvolver uma marca?

CHARLENE – Entendo que não se trata de um único canal. Alguém pode dizer: “Tenha um blog, essa é a solução. Afinal, todo mundo tem um blog.” Isso não é uma verdade absoluta. O seu caminho talvez passe por um blog, mas talvez passe por uma rede social, se uma boa quantidade de consumidores a estiver usando. No final, tudo depende da relação que as pessoas querem estabelecer. Então, se você está falando em desenvolver a sua marca não há um único caminho. A melhor forma de olhar para isto é pensar em quem quero atingir: são os meus clientes, meus funcionários, meus parceiros ou todos os três?


DINHEIRO – Mas como os executivos que desejam estabelecer um canal de comunicação com os seus clientes e consumidores devem agir?

CHARLENE – Neste caso, a primeira questão a ser respondida é: por que um executivo quer estabelecer um relacionamento com o público? Qual o tipo de relação que ele deseja criar? Clientes, consumidores e a audiência em geral precisam e querem entender qual o motivo para a sua presença online. É por que você quer me vender alguma coisa? Ou então por que você quer saber a nossa opinião sobre algo? Entendo que um objetivo claro é o primeiro passo para um bom canal de comunicação.


DINHEIRO – A sra. pode contar um exemplo de uma grande companhia que soube responder de forma efetiva a uma grave crise online?

CHARLENE – Sim, há muitos exemplos no livro, mas destaco um episódio envolvendo a Johnson & Johnson, que não está lá. Ela criou uma campanha voltada para as mães para divulgar uma linha de remédios para dores musculares. De repente, quase dois meses depois, um monte de gente em blogs e no Twitter começou a protestar. A campanha foi acusada de usar um tom impróprio para divulgar o remédio para mães que carregam seus bebês em suportes junto ao corpo. A peça trazia uma série de frases que tentavam se conectar com as mães ressaltando as dores causadas pelo ato de se carregar uma criança e mostrava o remédio como solução para elas. Alguns críticos notaram que a peça tratava os bebês como acessórios. “Vestir seu bebê parece estar na moda” era a frase que abria um dos vídeos. Em 48 horas, a Johnson & Johnson tirou a campanha do ar e a vice-presidente de marketing da companhia começou a se desculpar com blogueiros pessoalmente. A Johnson & Johnson foi hábil em lidar com essa crise e falar com a imprensa, criando inclusive o seu próprio blog para tratar do assunto. Paralelamente, a empresa encontrou mães que haviam usado o produto e estavam dispostas a dar os seus testemunhos sobre os efeitos positivos do tratamento. Logo, a empresa colocou alguns vídeos no YouTube com depoimentos dessas mães. Essa virada, é claro, só foi possível porque ela já tinha construído previamente sua credibilidade junto ao público. O melhor dos mundos, no entanto, é quando você consegue criar uma relação tão forte com uma parcela do público que ela mesma defenda você.


DINHEIRO – Qual a importância de ouvir nas redes sociais?

CHARLENE – Total. Só assim você pode se antecipar ou ao menos ter conhecimento de uma crise que pode estar se formando. Empresas como a HP e Dell não costumam esperar que o consumidor ligue para a empresa para reclamar de alguma coisa. Ao primeiro sinal, elas costumam entrar em contato com os clientes insatisfeitos em seus blogs ou no Twitter e perguntam: “O que está acontecendo? Como posso lhe ajudá-lo?” Isso é algo que você não poderia fazer no passado. E essa é a forma mais proativa que uma empresa que presta um serviço pode agir. Além disso, a relação que se estabelece entre cliente e empresa é outra.


DINHEIRO – Nos últimos anos vimos a ascensão da web 2.0 e das redes sociais. O que a sra. espera para os próximos anos?

CHARLENE – A internet vai se tornar cada vez mais móvel e interligada, quase tudo que você precisa fazer conseguirá pelo telefone. Dessa forma, poderemos estar conectados a qualquer hora e em qualquer lugar. E as redes sociais vão estar em toda parte. Elas vão se tornar como ar. Estaremos sempre conectados, mas precisamos manter um equilíbrio, não devemos nos tornar escravos da tecnologia. E é assim que lido com ela.


DINHEIRO – Qual a sua principal mensagem para os executivos brasileiros?

CHARLENE – Não subestimem as redes sociais. As comunidades online que você usa na sua vida pessoal, como passatempo, podem e devem ser usadas no seu trabalho, para que a empresa em que você trabalha possa atingir seus objetivos. As companhias que conseguem fazer isso bem estabelecem uma relação de confiança com o público, mas o controle é relativo. A principal razão para muitas empresas não participarem dessa revolução é que elas temem não estar no controle do que as pessoas vão dizer. E o meu ponto é que tudo isso não vai embora de uma hora para outra. Então é preciso aprender a lidar com isso e, se possível, tirar proveito desse movimento.

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